terça-feira, 6 de agosto de 2013

Região norte, ferida aberta para o progresso
Sugada pelos sulistas e amputada pela consciência nacional...

 
Vão destruir o Ver-o-Peso
e construir um shopping center
vão derrubar o palacete Pinho
prá fazer um condomínio
coitada da cidade velha
Que foi vendida pra Hollywood
Prá ser usada como um albergue
No novo filme do Spielberg
Quem quiser que venha ver
Mas só um de cada vez
Não queremos nossos jacarés tropeçando em vocês
Aculpa é da mentalidade criada sobre a região
Por que tanta gente teme?
Norte não é com "m"
Nossos índios não comem ninguém
Agora é só hambúrguer.
Por que ninguém nos leva a sério
Só o nosso minério?
Quem quiser que venha ver
Mas só um de cada vez
Não queremos nossos jacarés tropeçando em vocês.
Aqui a gente toma guaraná
Quando não tem coca-cola
Chega das coisas da terra
Que o que é bom vem lá de fora
Deformados até a alma
Sem cultura e opinião
O nortista só queria fazer parte da nação
Ah! Chega de malfeituras
Ah! Chega de triste rima
Devolvam nossa cultura
Queremos o norte lá em cima
Por que onde já se viu?
Isso é Belém
Isso é Pará
Isso é Brasil
 
"Belém-Pará-Brasil", de Edmar Rocha Jr. e Mosaico de Ravena


sábado, 19 de janeiro de 2013

Natal na comunidade do Socorro, Margem direita do Rio Solimões

O Pacu pulou dentro do barco e a Marcela quase pulou fora, tamanho foi o susto. Coitado do Pacu, quase morreu do coração quando viu a Marcela. A Su só dava risada.  Eta rio mais rico, os peixes pulam dentro do barco sozinhos. Saudades dessa indiazinha e do Amazonas querido!

Alegria e festa. Reunião da comunidade, pessoas que se conhecem a muito tempo e que brincam sem pudores e vergonhas. A criançada assistindo se matando de rir. 

la profundidad...

Futebol da comunidade no fim de tarde na beira do Solimões. Paisagem fenomenal e pessoas muito tranquilas. Isto que eu diria qualidade de vida, apesar das dificuldades.
Tarde inteira conversando e tomando umas com os amigos da comunidade. Ali não fiz apenas amigos, mas irmãos profundos. Com o coração partido me fui embora, mas certo de que reencontrarei esta família novamente. 

Les Etóile que acompanham pelo caminho

Rafa e Natan. Paraná e Minas Gerais atacando um tambaqui assado.

Rafa, Rachel, Fer Curica, Dani, Careta e Neto na parceria do chopp na sexta a noite!
Saudades dos forrós com essa gurizada.

Os jovens protagonistas do fortalecimento comunitário da Floresta Nacional de Tefé: Hélida, Nai, Hefinho, Samuel e Tati. Preparando o seminário de Educação da FLONA de Tefé. Saudades enormes desse povo.

Subindo o Solimões em Direção a Alvarães

Saímos de Tefé, entramos pelo Paranã de Tefé até sair no Rio Solimões. Subimos o Rio por aproximadamente uma hora até chegar no município de Alvarães. No caminho me deparo com esta Samaúma. A maior árvore existente no Brasil, símbolo da Amazônia. 
Ela é linda, de uma beleza única, um desenho poético feito pela natureza!!!

Tambaqui pro almoço com a mulecada.

Paramos na estrada Alvarães Tefé. Um sitiozinho maravilhoso com esta casinha na beira de um lago. Vida boa demais. Quem disse que pobre não tem conforto. Aqui os donos, agricultores simples e trabalhadores, criam Tambaqui, Pirapitinga, Pirarucú e alguns quelônios, mas como em toda Amazônia, o apoio técnico é inexistente, a não ser enquanto favor eleitoral, ai rola solto. Mas quem sabe deixamos de saturar os sul com profissionais que ficam batendo cabeça e começamos a vir trabalhar pra dar apoio no norte?

Mercado municipal de Alvarães. Aqui se vende peixe dos pescadores do entorno, mas volta e meia aparece carne de caça de animais silvestres. Um município pobre, com pouco mais de 15 mil habitantes, a maioria na zona rural, mas com um prefeito bem rico. O prefeito adora comemorar suas festas com quelônios e ovos de tracajá, proibidos pelos órgãos ambientais. Mas quem disse que não existem mais coronéis?
Praia formada no centro do rio Solimões. Um verdadeiro mar de dunas baixas no meio do rio, época de seca, mas uma paisagem que só pachamama poderia conceber. 
Eu e meu amigo Dione Torquato. O Hefinho ficou de fotógrafo. Afinal pilotar uma baleeira pelo Solimões é uma experiencia necessária. Alguns acham que é só colocar o barco na água e sair andando, mas as coisas não são tão simples nunca, que bom. Mas já senti o que sente um ribeirinho quando tem que passar horas pilotando um barco, o braço sente bastante.
E o sol se pondo na margem esquerda do Rio Solimões. Momento mágico no interior da floresta encantada.
Não precisa de palavras!


Na Floresta Mágica da Comunidade São Francisco do Arraia

Dança dos Macacos doidos na Folia
Passei algum tempo com eles na comunidade, escrevendo um projeto pra conseguir recursos e financiamento desta atividade cultural que mobiliza toda a comunidade. Todas as apresentações que vi, me matei de rir, me encantei com os macacos e as crianças se divertindo a beça.

MÚSICA
Macaquinho subiu lá no pé da bananeira
Macaquinho subiu lá no pé da bananeira
Comeu tanta banana que lhe deu tanta coçeira
A cabeçinha coça coça a cabeçinha
A cabeçinha coça coça a cabeçinha...

Sentado ouvindo a composição do meu amigo Elson, o macaco prego e mais brincalhão dos macacos doidos. O Adrianinho assiste ao ensaio curioso. Na comunidade do Arraia.

Nem tudo é estudo, nem tudo é um doce, nem caldo com farinha. Trabalhar no roçado faz parte do aprendizado. Sentir na pele o que os agricultores sentem todo dia é uma disciplina que se aprende com vontade e imersão. Não na faculdade com ar-condicionado. Tava quente, tava duro, mas mil vezes o aprendizado desta forma.

Preçe Erzuli, Loa da Paz...

Abrete corazón,
Abrete sentimiento,
Abrete entendimiento,
deja de lado la Razón
y deja brillar el sol
escondido en tu interior.
Abre tu memoria antigua
escondida en la tierra , en el aire,
hace ya mucho tiempo
ya es hora
ya es hora
Como el amor CURA
Como el espiritu SANA
y la vida perdura.
                Rafaela, Loa do Amor.


quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

No aconchego da Comunidade São Francisco do Arraia

Relatos visuais da vivência mais profunda que ja tive. Acompanhar a rotina de vida de pessoas que vivem na e da floresta. Das águas, das chuvas, da seca e da cheia.
Reunião da família, esperando começar a Novela da Carminha e dando umas risadas antes pra descontrair.

Quase todos reunidos antes da janta, momento aguardadissimo, conversa, roda de comida e muitas histórias de vida.
A casa do Sapatinho (seu Raimundo) e da Dona Maria. Melhor estadia, melhor comida, melhor conversa, e a mulecada sempre pendurada.
Vista da Área da comunidade. Lá no fundo, a casa da Rejane, Claudemir e dos pequenos Dudu, Rafinha e Guilherme
No final da tarde, muitas pessoas da comunidade se reunem neste lugar sensacional, de frente para o Lago, conversando, rindo, descansando depois de um dia de trabalho e a mulecada brincando lá em baixo. Uma das vistas mais lindas de toda vida.
A peonada reunida indo abrir caminho pro ramal de energia. Os prós é que as comunidades terão energia elétrica em tempo integral, pela primeira vez na vida. O contra foio a forma como aconteceu a derrubada da mata e as condições de trabalho do pessoal. Pude acompanhar de muito perto.


Processo de escrita do projeto Macaco doido na Folia. Ameninada e os adultos estavam afiados. Me espantou a capacidade de aprofundamento que eles tem. Muito espertos, muito ligados, muitos curiosos apesar da pouquissima escolaridade, ou seja, a escola não é o único estimulador de conhecimento.

A cozinha mais bonita da dona Maria. Dali sairam as melhores comidas que comi na Amazônia.
A mulecada na hora do lanche. A partir da direita Jeane, Deuza, Duda (eu que chamo assim), Evila, Felipe e o capetinha mais criativo e ativo Bruno. A Deuza escreve poesias lindas e a Duda virou meu chamego. Todos com uma capacidade criativa impressionante, mas sem o estímulo...
Momento de estimular a escrita. O Dudu, na esquerda, frequenta a escola, mas é pilhado nas atividades que pra gente da cidade é chato. Ele escrevia todo o alfabeto várias vezes e algumas palavras. Já o Marquito, da direita, com seus 19 anos de idade, não sabe nem escrever o nome. Momento de profunda tristeza, de revolta, mas de esperança. O Marquito é muito dedicado, fez tudo que eu propus, mas a frustração de não continuar o trabalho é cruel...
E saca só a mulecada empolgadaça na pintura. Saiu cada desenho que eu emocionei, levei todos de volta pra POA. La em casa a partir de hoje, lápis de cor é item básico. Só falta a mulecada.

Quadro simbolizando a síntese das ideias da comunidade pro projeto cultural.
Essa mulecada me encantou. Me levaram por um mundo mágico, por uma fantástica fábrica de chocolate, e pelo país das maravilhas da Alice. Sentirei muita a falta deles. De ficarem pendurados em mim 28 horas por dia.

Seu Valdir e Dona Raimunda. Ele foi presidente da comunidade por muitos anos, tem uma cabeça sensacional e uma hora conversando com ele foi um semestre de aprendizado intenso. Ela, tranquila, uma das mulheres mais incríveis que conhecí, mais de 500 partos na vida, conhece cada criança e apesar de não enchergar mais com os olhos, as meninas grávidas sempre a procuram para saber como o bebe se encontra. Ela deveria dar aula na universidade, para estes médicos que acham que parto é como ninhada de cadela. Depois de conversar com ela, eu tive vontade de ser parteira.

Eh, almoço de domingo. Muito peixe, muita companhia, farinha e folhinha. Minha família amazonense.  
Vista do Lago de Tefé, da comunidade catuiri de Cima

Vista que a mulecada tem quando vai pra escola na Comunidade Catuiri de Baixo


segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Processo de Produção da Farinha

A farinha é um alimento muito apreciado na Região. Ela acompanha toda e qualquer refeição dos e das amazonenses. 
Almoço de Domingo com a Família da Dona Maria e seu Raimundo
Caldeirada de Tucunaré com Farinha

É feita da mandioca brava, que não se pode comer na forma tradicional da macaxeira, pois é tóxica. Da Mandioca Brava se produz a farinha, a tapioca e a tapioquinha. No sul chamamos macaxeira de mandioca, ou Aipim (palavrinha esta típica nossa). Não pensamos nenhuma utilidade alimentar para a mandioca brava no sul, mas no norte, nada se desperdiça. Nunca vi tão pouco desperdício de comida como aqui.

Para produzir a farinha da mandioca brava, eis o caminho:

1° PASSO - Roçar a mata, ou seja, derrubar as árvores do espaço que será realizado o plantio. 
Gugu abrindo espaço pro plantio. Além do calor, os bichinhos de cara com a derrubada da mata, nos atacaram.

2° PASSO - Deixa a mata derrubada secar por aproximadamente 30 dias. Com o sol forte e o calor da Amazônia é ligeirinho.
Volta da roça olhando o Campo seco, quase pronto pra atear fogo

3° PASSO - Depois de seco o mato, após um mês, toca fogo em tudo, utilizando uma tocha feita de casca seca amarrada na ponta de um pau. O que não queimar bem, vira lenha para os fornos depois.
Campo após o fogo "limpar" a área
4° PASSO - Após o solo estar exposto, mais fácil para o plantio, são plantadas MANIVAS (talo, tronco da mandioca) de outras roças em berços (não gosto da palavra cova, pois quem vai pra cova é morto) aleatórios, ao longo de todo o terreno roçado. Está colocada na terra a "semente" da mandioca pra delícia da farinha.
  
Dona Maria colocando Manivas na terra

5° PASSO - Quando as plantas estiverem com aproximadamente 50cm, é realizada uma capina na volta delas, para evitar competição de outras plantas pelos nutrientes do solo. A capina é realizada com o TESSADO, um tipo de facão colombiano.

6° PASSO - Quando a planta cresce mais ainda é realizada outra capina com o Tessado.
Plantação de mandioca do Elson e ao fundo a mata


7° PASSO - Quando o plantio completar um ano, já é hora de colher a mandioca e guardar a maniva para os próximos plantios.

Elson, eu e a Samira colhendo mandioca


OBS: É feito um segundo plantio no mesmo espaço. No entanto, a mandioca sairá com tamanho menor na segunda vez, pois o solo da Amazônia perde nutrientes muito rápido, principalmente quando está descoberto de vegetação de floresta, em decorrência da sua profundidade e da intensidade das chuvas. Após o segundo plantio e colheita, a área entra em descanso, começa a surgir a capoeira, uma vegetação primária, baixa, que vai dando lugar a floresta depois de alguns anos. É como curar uma ferida, que vai fechando. 

8° PASSO - A mandioca é colhida, posta no PANEIRO e carregada para algum igarapé, laguinho, cacimba. Em boa parte distante do local onde é plantada. O paneiro aguenta 100kg de mandioca e é este peso que os agricultores carregam nas costas, o única trasporte disponível: El lomo de campesino.
Volvendo del campo con la comida en el Panero

Os paneiros. Feito pelo Claudemir e a Rejane


9° PASSO - Deixa a mandioca de molho na água por três dias;


10° PASSO - Retira a mandioca da água e descasca. Um processo realizado com a mão, muito simples e rápido.
Vista da Comunidade do Estirão, descascando mandioca com Raimundo e sua esposa. Foto de Daniele Machado

11° PASSO - Carrega a mandioca descascada até a cozinha (como eles chamam o lugar onde se produz a farinha) e despeja na GAREIRA para escorrer. 
Raimundo amassando a mandioca recém descascada

12° PASSO - No outro dia, depois de escorrida a água da mandioca, é hora de cevá-la, ou seja, tritura a mandioca na BANCA.


13° PASSO - Manda a massa, na qual se transformou a mandioca para o TIPITI, e quando estiver enxuta (mais escorrida a água) manda para a peneira.
Tipiti: entrelaçado de fibras de palmeiras parecido com a pele da sucurí.

Massa sendo peneirada

14° PASSO - Após a peneira a massa é enviada para a EMBOLADEIRA.


15° PASSO - Coloca-se a massa novamente na peneira sobre o forno (um tipo de forma redonda gigante). 

16° PASSO - Com o forno a todo vapor, vai torrando a massa, já bastante caracterizada como farinha. A medida que vai torrando, a farinha vai ganhando a cara tradicional, amarelada e bem solta.



17° PASSO - deixa a farinha esfriar para guardá-la no saco.

18° PASSO - Vai suspendendo a farinha no ar (jogando para cima) para ir saindo os "grãos" mais finos. 

19° PASSO - Leva pra casa, vende no mercado.

20° PASSO - Come com uma caldeirada de TUCUNARÉ.

21° PASSO - Come com um peixe assado e arroz.

22° PASSO - Faz uma farofa com couve.

23° PASSO - Deixo pra tua criatividade resolver...